29Abr

No canto das paredes, no esqueleto adjacente da casa, em clima meio embriagado, descia-me a solidão. Os pés aplaudiam a terra como se o peito do pé arrefecesse o equilíbrio das mãos. Sentado, num monólogo ao vento, cantava a canção dos combatentes. Pintei meu interior à cor da puberdade. Sorri leviano. No rosto campava-me a distracção dos glóbulos vegetarianos. Os rumores, a sombra, os pensamentos terrestres, tudo gozava à aparição da real idade real. Debruçando sobre o estado dissolvente, bem no meu cantinho, observando a vida no mais profundo, cogito.

Antes daquele dia, morri. Acabei de viver um dia sem me despedir. Cansei-me de olhar bem perto sem poder de perto tocar o que vi. Estava entre as pernas, enjoado de tanto trabalhar. O resultado era, senão, beijar o escorregadio e elástico nutriente químico quase sem cheiro. Um grupo de fantasmas, dentre a multidão, lá estava eu, num esperma abraçando ‘‘Zóide’’ sem noção do mundo. Plantei-me nu com vento enquanto o vento no convento soprava levianamente. Germinava entre as matas queimadas e uma enorme Tunda Vala. Os arbustos estavam sendo cortados. Entre as paredes, sentia-me molhado como se de boca aberta um cão desesperadamente discutisse de tanta sede. Era quase um buraco negro de camadas vermelhas e uma trompa bem no meio do caminho. O buraco era tão fundo que fazia eco ao gritar – embora fosse escuro, corríamos para chegar ao zénite do portal mais estranho que o torneio d´onde ví(emos). Corremos e corremos… e de repente:

            – Pára! Não pára!

– O que foi?!

– Nada não…eu ainda não gozei.

– Tudo bem… vamos a isso.

Parecia-me que a Tunda Vala estava conversando. Ela mexia-se de um lado para o outro: – Pára, pára! – era mesmo um desejo de curiosidade subindo a minha mente. Foi quando depois duns minutos, nós escorregávamos enquanto derramava entre as paredes vermelhas cobertas de arbustos, águas melosas por todo o lado. Ao olhar para trás percebi que todos quanto estavam na mesma corrida comigo haviam desaparecido. Entrei tão rápido que nem deu pra perceber. Foi quando gritei tão forte: Socoooorrooooooooo…

O eco ecoava ecoando profundamente sem nenhum feedback. Tornei-me num recluso, num prisioneiro sem ter cometido qualquer crime. Eu estava bem lá, fechado durante cinco meses. Empurrava as laterais daquelas grades e escorregadas camadas num formato bola. Enquanto isso, do outro lado da margem, ouvia-se barulho e movimentos estranhos. Estava estranho num mundo estranho! O que se pode esperar?!

Eles eram ingratos. Nunca senti falta de nada, mas, dentre todo aquele líquido vermelho, a fome penetrava no estômago. Mais quatro meses, sem reclamar, decidem libertar-me das correntes do medo – entendi que não haviam encontrado crime algum em mim. Ao sair, deu uma vontade de chorar. Vi gigantes, homens de longos cabelos iguais aos das suas esposas. Entre sombras e penumbras, em meios sorrisos rasgados, o espaço parecia-se com o céu donde saí. Neste exacto momento, chorei as primeiras palavras:

– Vocês são mesmo loucos! Tirem-me estas cordas!

Tinha razão quando pensei em gigantes. Estava fora de mim, admirado com a situação. Chorando, chorava sem parar enquanto o sistema todo estava sorrindo e festejando. Era uma média de cinco gigantes. Nunca tinha sentido o prazer biológico, mas, naquele dia, caguei. Caguei-me por completo e eles limpavam-me por inteiro e sem hesitar.

– Corta-lhe o cordão umbilical porque hoje vamos festejar!

– Com certeza, querida.

– Vai avisar que ele já veio ao mundo.

– Deixa comigo, meu bem! É pra já.

O ambiente estava a ficar interessante. Mordia-me do coração ao ponto mais alto da felicidade. Gritando, gritei silenciosamente: – Cambadas de gigantes. Eu vi mais de mil montanhas, arbustos gigantes, uma enorme fogueira. Eles sorriam e felicitavam. Achei que seria maltratado e posto numoutra cela. Revirou a história.  Trataram-me como se fosse um Rei.

Este mundo onde vim parar é muito caótico. Bem naquele dia em que pensei em pensar em acostumar-me com a ideia de viver no mundo deles, virgulei meu âmago. A comida vinha de um óvulo com uma pontinha aonde saia um líquido branco que eles chamavam de leite. Era sem sabor. Enquanto chupilingava as águas brancas, em volta dum jango, conversavam sobre o futuro.

– Sinto que esta criança vai nos dar tudo que quisermos.

– Puxa vida, ele saiu mesmo o pai.

– Ainda duvidas? – perguntou Zóide.

– Claro que não, Vajandanda. Era só para te ouvir.

– Tenha cuidado com as palavras. O meu filho vai-me sustentar, quando crescer vai servir como minha protecção em vários momentos.

Até nome me deram. Chamaram-me de criança, e o mais intrigante é que minutos depois chamaram-me noutro nome, filho. Eu não entendia mais. Não sabia se era criança ou se era filho. A partir daquele momento passei a ser kaxiko de mim mesmo. Gostava mais quando éramos uns líquidos em grupo, nem sabia sequer que precisaria de um tecto para morrer lentamente. – É chato viver e servir a mim mesmo, quanto mais aos outros?! Eu sou alma. O que fiz para merecer tanto desconforto? Acredite que quando me tornei homem, passei a trabalhar sem parar, era mesmo kaxiko dos homens. Eu era uma alma improvisada num corpo humano. Confesso-vos que uma das empresas que mais me lixava é o lixo do meu corpo. Trabalhei quase uma eternidade e o salário é a ingratidão, mesmo depois da minha existência, de corpo ao sol me rebento reflectindo sobre o descompasso e a metade da injustiça que agruparia o meu interior.

Calei os dedos para não inventar o que a boca não seguraria dizer. Depois de tanta história, hoje a Tunda Vala expirou, atingiu a menopausa, já não chorava mais lágrimas de sangue, nem cozinhava mais maxanana, nem molho de kasakaya. Outras almas decidiram ficar em coma e coma morrendo de asfixia.

Hoje estou onde estou. Nem sei onde estou!

Aqui, onde estou, é o limite dos sonhos, realidade dura!

Espero a decisão do Gigante dos Gigantes!

Eles dizem que vêm do pó e ao pó voltarão!

Morri em mim mesmo, libertei-me de mim!

Agora entendo por que a terra come e o céu chora!

Estou voando.

Atalhos:

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