“Não existe outra forma de chamar o livro se não fosse «A Passagem Estranha em Muzondo» porque todo o passo de um poeta é sempre estranho”
Todo e qualquer discurso de natureza axiológica como é este carece sempre de uma finalidade que é de circunscrever a estrutural da obra: é neste prisma que posso afirmar que o livro é obra poética, escrito com viés de estética surrealista e simbolista, equivalente a multifacetada reflexão que proporciona ao leitor uma elevada complexidade artística que se pode viver ao longo da leitura, pois, o autor trás textos de poesia específica. Suas relações artísticas com a realidade aproximam-se das razões de honra com a terra Muzondo e se configura numa abordagem amorosa e patriótica dos fenómenos sociais.
Em Muzondo Sob o Olhar Místico da Lua é uma obra publicada em dois mil e dois, pelo escritor angolano, Ras Nguimba Ngola, com a chancela da Editora Palavra&Arte. Onde o autor, aproveitando a contemplação da vegetação e dos hábitos da gente daquela, apresenta a sua importante viagem que faz:
a) Enfio-me no Chevrolet. Sigo para além do Panguila. Um pouco mais adiante tem a comunidade de Muzondo.
b) Junto da gente que vive da terra, deixo-me divagar, cogitar, rememorar, inquirir, denunciar, clamar. Nestes assuntos trago de forma metafórica, elegórica e imagética a figura de lua, mar, flor, noite e pátria. Pág.9
Neste inicial texto, demonstra configurar já como que palavras chaves de todo o livro: empenhando-se em recuperar a versão original das passagens nesta comunidade; o livro foi escrito em quatro partes: I-Metáfora, Presença Lunar. II-Metáfora, Presença so Mar. III-Metáfora, Presença da Flor. IV-Metáfora, Presença da Pátria. Cada parte corresponde a uma viagem ao Muzondo. De modos que a primeira viagem o poeta surge em cada página cheio de tesão, arrumando textos de chegada e saída ao Muzondo, enfiando nos mesmos uma carga de erotismos, os títulos aparecem no fim de cada poema, característica agristética, com o lógico sentido de que são os textos que dão nascem os títulos e não o inverso.
Ao pensarmos em Muzondo Sob o Olhar Místico da Lua, podemos imaginar que existe um sucessivo evento que se dá pela surpreendente realidade dos factos que se-nos apresentam, ao qual podemos designar (amor-sentido diante de um santuário, feito nas noites de luar cheia), que existe um poeta que vive uma forte erupção de romance, de tal modo inesquecível, em que, muitas vezes, aparece como uma espantosa expressão que se encontra no quadro de cada página:
c) Deixa-me ó lua joelhos dobrar
No portal do santuário
Deixa-me sentir doce incenso
Me elevar solto e leve
Deixa-me estar no teu peito imenso
Sentir sistólica e diastolicamente tam tam da vida pág.13, (VII apelo)
Este poema demonstra que a vida humana está limitada na consumação da imortalidade artística que, por vezes, confere subitamente o extraordinário imaginário do cristianismo e o poeta transformou-se num devoto por meio da mulher que aparece dentro da lua:
d) Foi quando enfiei vigorosamente a palavra –erecta-
No orifício misterioso amparado entre duas
Acácias vi-me cinganji num ritual de divinos prazeres. Pág.15 (III Iniciação)
O autor reúne textos que criam uma conexão composta por um mundo chamado Muzondo, ideias que acordam um propósito de véspera, atingindo o ponto ilimitado de interpretações literárias dentro da cultura africana de orgens:
e) Versos são resistências de tempos sem identidade
Africana reluzente «acabamento de obra sem igual
Regista à alienação da sagrada herança. Pág.14 (III Encantamento)
O livro compartilha opiniões, discote a sociedade, encontra a nação e toca a alma de cada leitor, rasga os jornais e fala de paz:
f) Na parte invisível de meu ser
g) Desenho emblemático de um sonho
Dos olhos da lua brilho denunciador
Via-se rainha no simbólico cume de êxtase
Alegre ascensão nas várias moradas da luz. Pág.15 (III Iniciação)
Do ponto de vista poético, é um dos mais lúcidos da nova geração, pois, ele além ser engajado, é caracterizador do seu autor, que sente enorme preocupação em desnvolver tecnicamente, configurando nos textos uma linguagem exótica, com fé e vontade de efeitos de lutas e colorida promoção da história:
h) Kimpa Vita
Adornada santa de fogo ardente
Sinto afável toque de teus mágicos dedos
Cantam passarinhos melodiosos hinos de liberdade. Pág.23 (Kimpa Vita)
Conheci nestes textos o escritor Ras Ngimba Ngola como sendo um escritor que se encanta com a ideia de que sua obra é um sinal de moralidade e que a literatura seja a fidelidade para a sua memória:
i) E o poeta
Ser de areia movediça
Na rebentação de escondidas ondas
Sondo a alma escancarada.
Abro-me num anseio de paz universal
Afinal o dia é presente perfeito
Dos deuses em meditação. Pág.33 (Deus do Mar)
O existencialismo é uma pedra de construção do eu poético, é um tipo de texto que se inscreve com o propósito de tomar uma interpretação inclusivista de outras da arte, cria um sentido de compreender tudo o que se vive enquanto se escreve.
Os textos aduzem o debate de Platão sobre a função social do poeta, desafia o mundo utilizando uma hipótese de língua surpresa com vista a criar condições de humanização, para que a mensagem passe fingida e manipulada; própria de obras nascidas em lugares por onde os escritores vivem exilados.
A forma dos verbos demonsta o tipo de poeta que há em Ras Ngimba Ngola, de modos que, parte com um conjunto de explicações que são uma ameaça de arquivamento de interpretações políticas das suas teorias da viagem estranha em Muzondo. Pois, a linguagem que utiza dá-lhe uma vantagem artistica, de tal sorte que encontra um equilíbrio em Zenão de Eleias, um filósofo grego, que já ensinava que a linguagem manifesta o ser que está em nós, por ex. basta que alguém abra a boca para se saber o quanto é a pessoa que é. Nguimba Ngola, ao pretender alinhar a compreensão do seu discurso poético como sendo uma homenagem à lua e ao mar, bem como à flor e pátria, aproxima-se, como que, aos ideais de elogios fúnebres sobre aqueles temas, pois a sua intenção é mesmo de demonsstrar a axiologia moral da compaixão, a promoção da humildade e a erradicação da corrupção das institucionais:
j) Amaldiçoei anjos/demónios e deuses corruptos das igrejas
Vendi a fé
A esperança deixei-a deitada à porta da assembleia
De ganaciosos umbigos representantes. Pág.34. (vem poeta).
Assim, a leitura deste livro atribui conscência ao homem e propõe garantias de um conhecimento profundo sobre o Muzondo da lua, da flor, do mar e da pátria; liberta o individuo de todo o naturalismo, atenta ao que é surreal, ajusta o fenómeno social e limita o longe da existência da literatura:
k) Língua de poeta é fogo ardente da alma
Sente dor do capim em chama
Alma rebelde
Perde o medo do céu corrupto
Não é justa a divisão do pão. Pág. 56 (protesto poético)
O que mais pode interessar como leitor é o fim de perceber tudo o que nele se fala e se conta, o estilo com que é criado; em qualquer obra existe uma realidade que pode nutrir a ideia de que a literatura é, na verdade, a conexão menos inútil entre o homem e a natureza das coisas; pelo simples facto de que a literatura é sempre expressão das novas tendências e/ou realidades e, por isso, depende do criador que a representa.
Assim, com Nguimba Ngola adquire-se o existir de uma literatura capaz de tratar sobre o amor dentro da intervenção política e social dos nossos problemas. Em fim, é dado que é especialista com as mãos de poeta.
Para o poeta o amor não é sexo, e sim, aquele que explora as relações dos homens, por isso, o conteúdo deste amor é guerra e paz, alívios e desgraças. Portanto, os seus poemas chegam ao mundo para enfrentar diversas questões que o preocupam.
A literatura de em Muzondo nasce para dar respostas empunhando perguntas, inquietações, abrindo a consciência e criando a sensibilidade para as novas perspectivas do real. É como a filosofia, muitas vezes, o encontro de uma resposta pode revelar-se menos relevante que o facto de se ser capaz de viver a pergunta, ou, de andar pelas pistas que ela tende a abrir em nós:
l) Vê-se claramente assimétrico quadro
Desenho dos ndokis e kifumbes embriagados
Lágrima do capim clama sem voz foge-lhe o sonho
Enfio a mão na dolorosa ferida da mátria
Protesto inventando o mundo novo
Construção dialéctica da era nova
Voz de poeta é grito. Pág.56 (Protesto Poético)
A poesia de Nguimba Ngola busca assim a problemática do existencialismo, o conteúdo ideo-estético do livro remete em certos momentos e especialmente para a construção de textos a partir da invocação de crenças, tradições, ritos e práticas mágicas que configuram a filosofia africana (o modo de pensar dos povos africanos).
Do ponto de vista sociológico, grassa, em alguns textos, um animismo de grande expectativa lúdica, na medida em que constitui uma das formas de como levar o leitor em grande questionamento do existir e das origens das coisas. O tema do animismo coloca-nos numa reflexão de que a forte presença de uma realidade mística nos textos poéticos seja ousadia de elevar a condição da corrente literária para a vida dos poetas e não apenas de prosadores.